Dário anda nisto há muitos
anos. Tantos que ainda se lembra do tempo em que ganhava muito dinheiro em
Bolsa. Mas agora Dário anda confuso. Vê bancos comprados sem OPA, cimenteiras
vendidas à porta fechada, dividendos que já não são divididos, coisas perpétuas
que morrem. Dário, o minoritário, relê os livros e não encontra resposta: onde
errou Dário?
Dário anda nisto há muitos anos. Tantos que
ainda se lembra do tempo em que ganhava muito dinheiro em Bolsa. Mas agora Dário
anda confuso. Vê bancos comprados sem OPA, cimenteiras vendidas à porta fechada,
dividendos que já não são divididos, coisas perpétuas que
morrem. Dário, o minoritário, relê os livros e não encontra resposta: onde errou
Dário?
Dário, temerário, foi um dos 700 mil portugueses que começou a investir em Bolsa com a privatização da EDP, nos anos 90. Ganhou 30% no primeiro dia. "Espectáculo!", pensou Dário, "nasci para isto". E assim, durante anos, Dário não era bem Dário, era milionário. As acções subiam sobre uma bolha que ele não percebia, mas como era beneficiário, não fazia perguntas, só fazia contas. A bolha estoiraria e Dário, o perdulário, decidiu não ser mais corsário. Doravante aprenderia as regras, a prudência e o dicionário. E foi estudar. Ler. Aprender. E cumpriu.
Dário, o apartidário, diversificou a carteira, tirou os ovos do mesmo cesto, sabendo que o risco assim desce, mesmo que desça também a rendibilidade esperada. Dário mediu os "price-earnings", ponderou as dívidas sobre os EBITDA, calculou os betas, leu os relatórios e avaliou os "dividend yields". E assim Dário, o visionário, investiu em banca, em acções do BPI e em obrigações perpétuas do BCP e do BES; comprou Brisa por causa do dividendo estável; a Cimpor pelo ângulo especulativo; a REN porque era segura, a EDP pela internacionalização, a Galp pelo futuro. Depois, relaxou: não há erro no receituário!
Agora, Dário fica incrédulo quando lê este diário. A La Caixa passou a deter 48% do BPI, saltando a barreira dos 33%, e não há OPA?! Mas como, se é uma óbvia posição de controlo, ainda por cima com o alinhamento do Allianz? Como, se nunca a CMVM tinha antes dito que as limitações estatutárias são razão para dispensa de OPA? Dário consegue, enfim, perceber que numa Jerónimo Martins um accionista com 40% não poderia mandar, pois a família Soares dos Santos continuaria a controlar com 56%. Mas... no BPI?
Calma, Dário, sim, é extraordinário, mas é coisa de bom empresário. Sim, retorque Dário, mas e a Brisa? Nessa há OPA, mas é como se não houvesse: o preço é abaixo do cão que está a pagá-la com o seu pêlo: o pêlo do cão e o pêlo do Dário. Porque o dividendo foi suspenso, o ordinário, já não sai da empresa. Como?! Pois, Dário, o mundo mudou, há que ser evolucionário. E na Cimpor, questiona Dário, suspenderam a Assembleia Geral para não pagar o dividendo? Mas então... a OPA é baratinha, já está acertada com o Governo, o Governo manda na Caixa, a Caixa manda no BCP, ambos mandam em Manuel Fino, se é assim, então e o minoritário?!
Dário acredita nas pessoas, se lhe dizem que o negócio da Cimpor não estava fechado antes de ser lançada a OPA, ele acredita, acredita no Governo, na Caixa e na Camargo, são pessoas de bem. Mas caramba, pensa Dário, a linha do tempo perdeu a continuidade: no dia 30 de Março, às 16:36, o Negócios noticiou o lançamento da OPA; às 17:14 o Negócios diz que o Governo já deu o acordo de venda da posição da Caixa; só às 21:00 é que a OPA é comunicada oficialmente; e 26 minutos depois a Caixa comunica que vai vender. Dário interroga-se: como é que é que a Caixa responde em 26 minutos que venderia a Cimpor, depois diz que não tinha decidido antes das 21 horas, mas também garantiu que não toma decisões dessas em 26 minutos? Dário esfrega os olhos para ver se acorda. Mas outra coisa não lhe sai da cabeça: como é que o Negócios noticia às 17:14 uma decisão que a Caixa diz só ter tomado depois das 21:00?! Como nem passa pela cabeça de Dário duvidar de quem jura que não houve concertação, só há uma solução: há um bruxo no Negócios!
Dário está perdido, sente-se num infantário. Umas empresas mudam de controlo sem OPA: a REN e a EDP agora chinesas, o BPI espanhol, ou melhor, catalão, e até na Galp quem mandava agora manda mais, pois havia uma concertação legalmente contratada. Coisas de advogado judiciário. Outras empresas lançam OPA, à briosa Brisa e à simpática Cimpor, mas Dário não ganha nada e ainda perde dividendos. E as obrigações perpétuas do BES e do BCP, que é feito, Dário? Dário pensava que "perpétuas" queria dizer "para sempre" mas elas já não existem; e que "obrigações" queria dizer "segurança", mas trocaram-nas por acções que valem menos de dois terços.
Dário, Dário, não desistas. Serás agora missionário. As empresas têm de ser salvas, elas e o empresário, e tu, no fundo, és um especulador da bolsa, tens o que mereces. Mesmo que te sintas um perfeito... como é que se diz? Qual é aquela palavra com seis letras que rima com minoritário?
Dário, temerário, foi um dos 700 mil portugueses que começou a investir em Bolsa com a privatização da EDP, nos anos 90. Ganhou 30% no primeiro dia. "Espectáculo!", pensou Dário, "nasci para isto". E assim, durante anos, Dário não era bem Dário, era milionário. As acções subiam sobre uma bolha que ele não percebia, mas como era beneficiário, não fazia perguntas, só fazia contas. A bolha estoiraria e Dário, o perdulário, decidiu não ser mais corsário. Doravante aprenderia as regras, a prudência e o dicionário. E foi estudar. Ler. Aprender. E cumpriu.
Dário, o apartidário, diversificou a carteira, tirou os ovos do mesmo cesto, sabendo que o risco assim desce, mesmo que desça também a rendibilidade esperada. Dário mediu os "price-earnings", ponderou as dívidas sobre os EBITDA, calculou os betas, leu os relatórios e avaliou os "dividend yields". E assim Dário, o visionário, investiu em banca, em acções do BPI e em obrigações perpétuas do BCP e do BES; comprou Brisa por causa do dividendo estável; a Cimpor pelo ângulo especulativo; a REN porque era segura, a EDP pela internacionalização, a Galp pelo futuro. Depois, relaxou: não há erro no receituário!
Agora, Dário fica incrédulo quando lê este diário. A La Caixa passou a deter 48% do BPI, saltando a barreira dos 33%, e não há OPA?! Mas como, se é uma óbvia posição de controlo, ainda por cima com o alinhamento do Allianz? Como, se nunca a CMVM tinha antes dito que as limitações estatutárias são razão para dispensa de OPA? Dário consegue, enfim, perceber que numa Jerónimo Martins um accionista com 40% não poderia mandar, pois a família Soares dos Santos continuaria a controlar com 56%. Mas... no BPI?
Calma, Dário, sim, é extraordinário, mas é coisa de bom empresário. Sim, retorque Dário, mas e a Brisa? Nessa há OPA, mas é como se não houvesse: o preço é abaixo do cão que está a pagá-la com o seu pêlo: o pêlo do cão e o pêlo do Dário. Porque o dividendo foi suspenso, o ordinário, já não sai da empresa. Como?! Pois, Dário, o mundo mudou, há que ser evolucionário. E na Cimpor, questiona Dário, suspenderam a Assembleia Geral para não pagar o dividendo? Mas então... a OPA é baratinha, já está acertada com o Governo, o Governo manda na Caixa, a Caixa manda no BCP, ambos mandam em Manuel Fino, se é assim, então e o minoritário?!
Dário acredita nas pessoas, se lhe dizem que o negócio da Cimpor não estava fechado antes de ser lançada a OPA, ele acredita, acredita no Governo, na Caixa e na Camargo, são pessoas de bem. Mas caramba, pensa Dário, a linha do tempo perdeu a continuidade: no dia 30 de Março, às 16:36, o Negócios noticiou o lançamento da OPA; às 17:14 o Negócios diz que o Governo já deu o acordo de venda da posição da Caixa; só às 21:00 é que a OPA é comunicada oficialmente; e 26 minutos depois a Caixa comunica que vai vender. Dário interroga-se: como é que é que a Caixa responde em 26 minutos que venderia a Cimpor, depois diz que não tinha decidido antes das 21 horas, mas também garantiu que não toma decisões dessas em 26 minutos? Dário esfrega os olhos para ver se acorda. Mas outra coisa não lhe sai da cabeça: como é que o Negócios noticia às 17:14 uma decisão que a Caixa diz só ter tomado depois das 21:00?! Como nem passa pela cabeça de Dário duvidar de quem jura que não houve concertação, só há uma solução: há um bruxo no Negócios!
Dário está perdido, sente-se num infantário. Umas empresas mudam de controlo sem OPA: a REN e a EDP agora chinesas, o BPI espanhol, ou melhor, catalão, e até na Galp quem mandava agora manda mais, pois havia uma concertação legalmente contratada. Coisas de advogado judiciário. Outras empresas lançam OPA, à briosa Brisa e à simpática Cimpor, mas Dário não ganha nada e ainda perde dividendos. E as obrigações perpétuas do BES e do BCP, que é feito, Dário? Dário pensava que "perpétuas" queria dizer "para sempre" mas elas já não existem; e que "obrigações" queria dizer "segurança", mas trocaram-nas por acções que valem menos de dois terços.
Dário, Dário, não desistas. Serás agora missionário. As empresas têm de ser salvas, elas e o empresário, e tu, no fundo, és um especulador da bolsa, tens o que mereces. Mesmo que te sintas um perfeito... como é que se diz? Qual é aquela palavra com seis letras que rima com minoritário?
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